Se conseguíssemos teletransportar uma criança de há 30.000 anos para a atualidade e a educássemos segundo os padrões atuais, ela seria indistinguível das crianças de hoje.
No entanto se quisermos responder à questão – desde quando somos Homo Sapiens? – a resposta não é fácil nem consensual. Parece até haver um enorme desajuste entre as evidências da biologia e as da antropologia.
Por um lado, os fósseis e o ADN dizem-nos que há 300.000 anos, o aparato biológico do homem atual já existia; por outro, a análise do artefactos, das ferramentas e da arte rupestre evidenciam que o “comportamento moderno” só apareceu há cerca de 50.000 a 65.000 anos.
Obviamente isto não quer dizer que haja erros na catalogação das datas. Tanto as evidências biológicas, como as antropológicas são muito robustas e coerentes. Essa diferença temporal entre o hardware humano (biologia) e o software (cultura) quer dizer que, mesmo com as valências cognitivas e físicas equiparadas às do homem de hoje, o desenvolvimento de uma cultura mais sofisticada demorou centenas de milhar de anos a aparecer, apesar de depois se ter expandido rapidamente.
O “grande salto” cultural ter-se-á dado devido à ampliação de experiências que a fusão tribal foi gerando. Esses efeitos de “rede cultural” aumentaram com as migrações que, através de conflitos, guerras e assimilações levaram sempre a uma maior convivência entre tribos diferentes, que assim foram acrescentando diferentes aspetos culturais, ao mesmo tempo que a maior dimensão das tribos miscigenadas ia exigindo novos modelos de organização social e ferramentas mais sofisticadas e eficazes para suportar a especialização do trabalho. Ao mesmo tempo, estas sociedades mais complexas, foram gerando maior riqueza na expressão artística.
Ou seja, a mistura cultural foi, há dezenas de milhar de anos, tal como hoje, uma espantosa força de progresso, a quem devemos o que somos.
